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"Mesmo longe, não me conformei... Pode crer, eu viajei contra a vontade"

O Alec se tornou uma figura expressiva do quadrinho nacional, em especial, da ala mais voltada ou puxada para o mangá, e mais particularmente ainda do quadrinho BL (Boys’ Love) brasileiro. Ele fez parte da primeira leva de artistas que compuseram a retomada de uma das principais editoras de mangás do mercado brasileiro, isso lá em 2021, quando “Lebre e Coelho” (que também será resenhado aqui no blog) foi anunciado pela editora. De lá para cá, se tornou uma figura emblemática, publicando em sequência: “Larry & Coelho” (volume 2 de “Lebre e Coelho”), “Pela Última Vez“, “Alec Apresenta“, uma coletânea de obras do autor, e mais recentemente, “Quem é Marceline?” um GL (Girls’ Love). Hoje, nos apoiaremos em “Pela Última Vez”. ^^

Pela Última Vez” é escrito e ilustrado pelo Alec. Foi publicado entre 2017 e 2019 no Tapas (acumulando quase 3 milhões de views). Em 2019, o Alec fez uma campanha de financiamento e publicou o mangá de forma impressa independente. A obra foi anunciada em janeiro de 2023 e foi lançada meses depois, no final de junho. Eu adquiri a obra a época do Anime Friends de 2023 e o Alec até autografou minha edição. A resenha vocês conferem abaixo. ^^

Sinopse: “O que você faria se só tivesse até o pôr do sol para se despedir de quem ama? Faz algum tempo que Kimo se viu apaixonado por seu melhor amigo de infância, embora sinta que não estão mais tão próximos como antes. Ele não tinha planos para se confessar, até que um infeliz acidente o faz ter que se apressar com essa decisão…”


  • História e Desenvolvimento

“Pela Última Vez” parte de dois garotos, então amigos de infância, que vivem suas vidas normalmente, sendo que um gosta do outro, mas nenhum deles tem coragem de confessar pelo medo de acabar sendo rejeitado e acabar estragando a amizade. Até que um dia, o Kimo sai para fazer compras para a mãe e, no caminho, acaba sendo atropelado e fica pendurado entre a vida e a morte. Motivado pelo desejo de poder falar com o amigo e paixão, o Lenny, pela última vez, o Kimo desperta e tem até o por do sol para expressar tudo o que sente…

Eu sou um grande fã de histórias de tragédia, amores em falência com a iminência do término e aquela sensação de as coisas estão se esvaindo, em ruínas. Mesmo eu sendo uma pessoa que não lida bem com a finitude das coisas, o fim estar à vista, quando bem trabalhado, sempre me instiga, engaja e comove. Vendo a proposta base, estava interessado, ainda mais vendo gente falando sobre como o mangá era triste, sobre como tinham lavado a alva de tanto chorar lendo e conhecendo o trabalho do autor já de certa data, tinha altas expectativas. Dito tudo isso, grande parte delas foram muitíssimo bem atendidas. Uma dada hora me senti meio frustrado, mas terminei o volume e a obra satisfeito no geral. O último 1/4 da história merece alguma consideração da minha parte (e deixo claro que é algo pessoal).

Toda a condução feita sobre o sentimento de perda, o arrependimento de não ter dito como se sentia e a iminência de nunca mais poder ver quem amamos, é maravilhosamente bem trabalhada pelo Alec ao longo da maior parte da obra. São páginas que exploram desde as consequências da imprudência ao volante e o peso que essa ação trás na vida daqueles que estão ao redor da vitima, mas o cerne se concentra no relacionamento do Kimo e do Lenny, que nunca poderá existir, girando na chave daquilo poderia ter sido e nunca será.

É nesse sentimento de lamentação que o Alec consegue evocar sentimentos, desde os mais bonitos aos mais dolorosos. E a partir desse desejo de tentar corrigir as coisas que o Kimo faz um “acordo” com os pequenos “espíritos” (não sei como chamar) que sustentam a alma dele nesse modo transitório: ele tem até o pôr do sol, ou seja, só mais algumas horas, para passar com o Lenny e pelo menos poder dizer como se sente. Ele, então, vai até o Lenny e o busca para um passeio, vão a um local de adoção de animais (e vale dizer, o Alec tem uma conexão e dá uma importância grande ao cuidado e adoção de animais em vulnerabilidade), caminham juntos, e aqui, já começamos a ver cenas do passado deles juntos, até que chegamos no parque de diversões que vai ser “”o ponto final”” deles.

Conforme vai se aproximando do fim do dia, mais vai chegando perto a hora da despedida. O Alec sabe como fazer uma história para chorar, já que toda a montagem vai sendo feita remontando momentos do passado dos protagonistas que passaram juntos, ao mesmo tempo que o pôr do do sol também vai ficando mais e mais evidente. Há um momento lindo entre os dois, sendo o pico e depois, vem o grande desfiladeiro do desespero (no melhor dos sentidos da palavra). Uma verdadeira montanha-russa com páginas e mais página do puro suco dramático e da mais alta qualidade! E àquela altura, eu já estava segurando o choro mesmo. Não vou entrar em detalhes, porque a carga dramática vem durante a leitura, mas tem sequências de páginas lindas aqui!

Eu gosto muito, mas MUITO MESMO dos primeiros 3/4 da história, porque eles são bem dramáticos, emotivos, ao ponto de eu quase chorar em vários momentos durante a leitura (estava lendo no ônibus, enquanto ia para a universidade, então segurava o choro), porque ele tem essa pegada de tragédia que eu absolutamente amo. Agora o último 1/4 da história merece alguma consideração. Como esse é um trecho com spoiler, eu vou deixar o aviso que o próximo parágrafo terá SPOILERS. Depois dele, voltamos aos comentários mais gerais e abrangentes. Para segmentar certinho, vou isolar esse parágrafo com páginas do mangá.

Eu tenho que confessar que fiquei um bocado decepcionado quando o Kimo consegue voltar e não morre no fim das contas. Eu acho que a obra perde muito ali, por todo o drama que foi sendo construído e elevado até ali, o que me passa a impressão de que foi meio que jogado fora (“derrubei lágrimas à toa”), que é um sentimento que eu tenho com o ato final do arco de “Samsara em “Genshin Impact”, quem jogou, sabe do que estou falando. Fiquei bem triste por o autor não ir até o fim com o que vinha sendo construído até ali, ao ponto de ler meio apático as páginas seguintes. Porééém, quero deixar claro também que não acho esse segmento final ruim, pelo contrário! Acho bom o que o autor constrói em um espaço tão curto de tempo, tem uma fluidez narrativa excelente, com a concretização e o nascimento de um relacionamento para chegar no ponto de uma construção familiar, a retomada na adoção do cachorrinho e até o casamento dos personagens. Acho bonito mesmo. Lá no começo falo que esse trecho “merece alguma consideração da minha parte” justamente por eu entender que pode não representar um sentimento mais geral por ser fruto do que vinha sendo construído, aliado às minhas expectativas com o conceito da tragédia. E algo que o Alec comenta ao fim do volume é que a época da publicação original, estávamos em um período turbulento, há que se lembrar que era época do (des)governo do Bolsonaro, e acho simbólico que tenhamos a representação de casais felizes. Acho que de desgraça, já bastava a realidade e se a realidade é triste e opressora, que ao menos na ficção possamos vislumbrar opções e situações mais felizes.

Há de se dizer, ainda, que gosto bastante dos extras contados na obra. Temos primeiro a história da mãe do Kimo, da conturbada relação que ela tinha com a mãe, da gravidez que teve e o abandono que sofreu do então namorado e pai do Kimo, a criar uma criança sozinha. E a outra história fala da relação do Lenny com o pai (outra relação também complicada), com o distanciamento entre eles a notícia do filho ser LGBTIA+ e tentando lidar com isso, mas não sabendo como reagir, principalmente não sabendo como se expressar. São extras curtinhos, mas bacanas que, como o próprio Alec comenta no apêndice da edição, tornam o background mais rico e interessante já que os personagens não fazem “cenografia” e tem suas próprias histórias, com suas próprias dificuldades e dramas vividos.

Dito tudo isso, ainda gosto muito do mangá. Acho que embora ele não tenha sido exatamente o que eu queria, ele se sai bem como um drama. Possui momentos belíssimos e com uma história bem redondinha e amarrada. Sendo um volume único, acho ainda mais fácil de recomendar. ^^


  • A Edição

“Pela Última Vez” foi publicado no formato 15 x 21 cm, com capa cartonada fosca e orelhas. Foi impresso no papel Off-set 90g, com 168 páginas (todas coloridas) e preço de R$ 49,90. Abaixo, vocês conferem o vídeo mostrando a edição:


  • Conclusão

Apesar da minha pequena decepção com um aspecto narrativo da obra, o todo do mangá é sim, bem positivo. Mesmo com esse sentimento, o Alec conseguiu contornar e me fazer comprar a ideia que ele propõe ao fim da narrativa, de forma que o sabor não termina amargo. Para os fãs de romance, tenho certeza que é um prato cheio!


  • Ficha Técnica
  • Título: Pela Última Vez
  • Autor: Alec
  • Serialização: Tapas
  • Quantidade de volumes: Volume único
  • Formato: 15 x 21 cm; capa cartonada fosca com orelhas
  • Preço de capa: R$ 49,90
  • Compre em: Amazon