O que fizeram chega a ser desrespeitoso com a autora!!!

O que fizeram chega a ser desrespeitoso com a autora!!!

Chegamos a tão aguardada (por mim) estreia de “Baraou no Souretsu” e bem… Eu vou me poupar de palavras nessa introdução, porque já estou muito puto com tudo que vi nesses 20 minutos de estreia, mas vou definir a estreia como: xoxa, manca, capenga, frágil e inconsistente.

Sinopse:A Inglaterra está dividida em duas casas lutando por quem elas acreditam ser o rei legítimo. Filho de um dos potenciais reis, Richard está lidando com uma batalha muito mais pessoal.


Como nem a sinopse, nem o anime deixam exatamente claro, vamos dar contexto as coisas. “Baraou no Souretsu” é a reinterpretação de duas peças de Shakespeare: “Richard III” e “Henri IV”. Ambas vão contar sobre os eventos da Guerra das Duas Rosas (1455-1485), que é a guerra entre duas famílias pela coroa da Inglaterra. Essas famílias são a dos York representada pelas Rosas Brancas, e a dos Lancaster representada pelas Rosas Vermelhas. Nesse contexto, o protagonista principal da obra é o Richard, que é um garoto intersexo e isso deveria ser um ponto importante para essa introdução, mas que acaba se perdendo e sendo atropelada como tudo nesse episódio.

Antes de começar a falar do anime mesmo, eu preciso dizer que não terei como não comparar com o mangá. Eu sei que devemos construir nossas análises tendo por base apenas a mídia que estamos vendo, sem se prender a outra. Entretanto, como alguém que leu o volume 1 do mangá, que sabe o que acontece nesse começo, não vou conseguir separar. Para fazer essa postagem, eu pedi para um amiga (@steh_x) que não leu o mangá e não conhece nada do original, que me contasse o que ela achou de ruim na estreia. Assim trarei tanto o meu embasamento como de alguém que sabe como é o início da obra original, como de outra pessoa que não tem tal conhecimento. Acredito que isso vá tornar minha análise um pouco mais equilibrada. Sem mais delongas, podemos começar a falar desse desastre ambulante.

Os primeiros dois minutos eu estranhei um pouco pela ordem que estava sendo feito, mas tinham coisas interessantes. Por exemplo, a apresentação inicial é feita com quadros estáticos lindos, que emulam pinturas, sendo um deles até a queima de uma pessoa (provavelmente Joana D’Arc). Fazem um pequeno paralelo com as palavras de seu pai e Warwick, sobre a decisão de disputar a coroa da Inglaterra, enquanto o Richard cavalga no meio da floresta com sombras para todos os lados, encerrando o momento com formas abstratas e que imitam vitrais de igrejas. Eu aprecio a direção em tentar realocar algumas informações no decorrer do episódio, porque não daria tempo de fazer de forma cronológica. Ele tenta criar momentos mais originais, que tentam passar a mesma essência do original, porque são momentos importantes, porém, suas tentativas falham na grande maioria das vezes.

Um exemplo prático, por volta de 3:40 do episódio, temos um momento com o Richard segurando a mão de sua mãe na frente da floresta, enquanto que de fundo, temos um diálogo com ela falando que há uma bruxa e que por isso, ele nunca deveria ir para lá. Mais para frente, sua mãe também o ataca verbalmente, dizendo que ele é a cria do demônio, uma criança amaldiçoada. Mas pera aí, o que mudou de lá para cá? Simples, nunca houve mudança. Ela sempre tratou o Richard daquela forma. O que acontece é que naquele diálogo na floresta, ela não estava falando aquilo para o Richard, mas sim para o George, porque ela sempre tentou afastar o George e o Edward do Richard, por ela ter em mente que o protagonista era um maldito, e que poderia “contaminar” os outros dois, bem como seu marido. Essa cena era muito importante e acontece logo no começo do mangá. A obra “abre” com essa cena da floresta e ela é continuada com algo que vem a aparecer tempos depois do flashback com sua mãe, que é o Richard no meio da mata escura, ouvindo vozes repetindo que sua mãe o abandonou, que é uma criança amaldiçoada… Esses momentos são importantes, porque a partir deles, nós entendemos um pouco do medo do personagem do escuro, medo esse que mal é apresentado no episódio.

Essa negligência por parte de sua mãe na infância, também justifica o porquê dele ver seu pai como sua luz. Fica confuso no anime a obsessão do personagem com seu pai e é por isso. A figura de seu pai foi o mais próximo que ele teve de carinho. Ele quer tanto que seu pai seja Rei, porque ali seria o momento de glória. Como ele diz: a Coroa abrirá as portas do paraíso. O pai dele é um símbolo, a coroa é o passe dele para um mundo melhor (no seu ponto de vista) e consequente felicidade, amor e carinho. Tendo isso em mente, também não é deixado claro o porquê do personagem querer tanto estar no mesmo nível de seus irmãos. Isso tudo é por ele se sentir inferior. Mencionei lá em cima que ele é intersexo, e que gera um grande complexo, porque ele não quer essas características “femininas”. Ele vê que isso o torna diferente de seus irmãos. Não é atoa que seu pai insiste principalmente para ele não desperdiçar sua vida com batalhas, e que o incomoda profundamente por esse lado. Na cena do espelho, mais no meio do capítulo, ele tenta cortar os seios que estão começando a crescer. Todos esses sinais vão sendo vistos como fragilidade (e sabemos de como mulher era vista nesses tempos) e sobretudo, como ele sendo diferente dos demais, é denominado como anomalia. Joanna D’Arc foi queimada e considerada bruxa dentre outros motivos, por se vestir de homem e liderar um exército. Importante lembrar que a caça às bruxas estava a todo vapor nesse período. No meio da festa, a filha de Warwick comenta que ele parece diferente dos outros. De apenas cogitar ser diferente, gera irritação e o assusta.

Uma peça muito importante nesse começo da obra e que é apenas jogada no meio da trama é Joanna D’Arc. Ela é um espírito e introduzida como alguém que é semelhante ao Richard e que vai assombrá-lo. Ela fica fazendo um “terror psicológico” no personagem. Como a mesma diz, ele é como ela. Isso o assombra e é um terror para ele. No anime suas aparições são completamente jogadas. Tem o beijo que ela dá nele e fica por isso mesmo. A fala dela enquanto ele estava junto do Henry na floresta soa completamente aleatória e sem sentido. Por mais que haja tentativa da direção em tentar fazer funcionar, não dá. Não é o bastante para segurar a lambança que foi feita tentando encaixar um volume em 20 minutos.

E nessa farofa, ainda tem o lado da família Lancaster que fica COMPLETAMENTE perdida e apática nessa bagunça toda! A presença deles no original é muito mais forte. Mal vemos a (maravilhosa) Margaret, que tem uma importância muito grande nessa guerra, pois ela que basicamente dita as ordens da família Lancaster (visto que o marido é um inútil), lidera os exércitos e sai à frente no campo de batalha com os Yorks. Não vamos nada disso. O que chegamos mais perto disso é ver seus lábios esboçando um sorriso em um frame do episódio :'( . Isso tudo é importante, porque ela quem quer continuar essa guerra. A personagem não quer perder o trono, faz planejamentos e de fato lidera a família para a sua vitória.

O Henry que aparece do meio para o fim do episódio tem dois encontros com o Richard e no anime, eles compilaram os dois, transformando em apenas um. Esses dois encontros são importantes, porque traçam os sentimentos dos personagens, como se sentem em suas respectivas posições e não só isso. No original existe um pequeno mistério sobre quem é o Rei, qual sua identidade, porque ele é bem perturbado com guerras. Não gosta daquilo e que seria o cara na floresta que diz para o Richard ser apenas um pastor de ovelhas. No anime, eles logo entregam que ambos são a mesma pessoa. O ponto nesse lado é que o Henry não quer ser Rei. Ele quer ser livre e é do desejo dele ser um pastor de ovelhas. Sua felicidade quando o Richard diz, sem saber a verdade, que ele é um pastor de ovelhas, vem do Richard não o reconhecer e naquele momento, ele poder encarnar aquilo para si. A própria questão dele não querer ser soberano vem de um trauma de infância ligado a essa cobiça pela coroa, de todos ao redor quererem forçar isso nele quando criança, cirando complexos ao ponto dele não querer saber nada daquilo e não ligar para morrer, contanto que tudo cesse.

A raiva do Richard com o nome do cara tem a ver com algo que acontece no mangá e que vai bem além do nome ser como o do Rei. Se dá a entender que o Richard achou que no momento que o Henry diz gostar dele, o personagem entende como um amor romântico e que na hora que diz que é como amigo. O Richard tem mais uma decepção por acreditar que alguém poderia gostar dele como ele é.

Eu estou preenchendo as lacunas deixadas pelo episódio para que vocês percebam como ele não se sustenta. Percebam que uma coisa não encaixa com a outra. A cena com o Richard ouvindo vozes na floresta era para ser perturbadora e para ilustrar um pouco da vida dele. De como ele é visto e no anime, é só vazio. Não tem peso e parece ser só algo para você ficar com pena do personagem. E acontece mais de uma vez ao longo do episódio e a tendência é que se mantenha, dado que adaptaram quase que UM VOLUME INTEIRO DO MANGÁ na estreia. SIM! Na ESTREIA do anime, adaptaram quase um volume inteiro, faltando CINCO PÁGINAS do volume para cobrir, e sendo bem sincero, se tivessem ido até o final mesmo, terminado o episódio com o gancho que tem nele, teria tornado a experiência um pouco melhor, principalmente para quem não conhece o original. Instigaria para continuar assistindo e ver no que dava. A obra será completa em 17 volumes no total e serão 24 episódios de anime. Se no 1º episódio já foi um volume inteiro, os próximos então devem manter essa mesma pegada, só com um ou outro episódio mais lento.


É importante pontuar também que a culpa não é da Staff. Por que eu digo isso? Pois mesmo que fosse uma staff FODA, com um currículo maravilhoso, ‘de respeito’, ainda não teria como salvar completamente esse projeto. TALVEZ algumas pessoas mais hábeis ajudasse? Com certeza, mas não tem como fazer milagre com uma obra que EXIGE que você dê tempo a ela para contar sua narrativa. Baraou no Souretsu é um mangá denso, que ora é carregado de texto, ora é poético e precisa de cenas mais longas para se expressar no subtexto. Ou seja, nas imagens ou animação, o que seus personagens têm sentido, o que eles têm para nos dizer com suas expressões. Sendo uma obra que precisa desses dois tempo (verbal e não verbal) para passar sua profundidade, não tem como dar certo. “Yuukoku no Moriarty” adapta 14 volumes em 24 episódios e apesar de Moriarty ter sua densidade, boa parte dos volumes da série tinham muitos casos isolados, que não necessariamente precisavam ser contados. Pular esses eventos não atrapalhava diretamente a narrativa. Mas é muito diferente de Baraou, que tudo é conectado. Não tem contos separados. É uma narrativa única que vai abrindo ramos, mas todos são muito importantes para o todo.

Nesse contexto, eu atribuo a culpa desse desastre primeiro para a J.C. STAFF como EMPRESA, pois estão sempre lotados de projetos e só nessa temporada, eles estão com 3 animes. A atenção deles não está em Baraou. Eles pegaram vários para produzir e que estreiam nesse ano (deve ter bem uns 10 previstos para 2022). O Sakuga Brasil comenta:

Guia Sakuga de Temporada do Inverno de 2022 | Animes que vão ser destaque em janeiro de 2022

O primeiro é que, como sempre, a J.C. Staff está bem atolada de projetos. Só nessa temporada de inverno ela estará com três animes sendo transmitidos além desse: o segundo cour de Realist Hero, o isekai Shikkakumon no Saikyou Kenja e o long-running Mewkledreamy Mix. Muito provavelmente o produtor de animação de Baraou será o Koji Okada (岡田耕二), tendo em vista que foi assim nos outros animes que o Kentaro Suzuki dirigiu no estúdio. Só que ele também é o produtor de Realist Hero, que será transmitido concomitantemente. Tudo indica que alguma parte da staff vai estar trabalhando ativamente nos dois ao mesmo tempo.

O segundo obstáculo é que a informação que se tem é a de que esse anime irá ao ar por dois cours (cerca de 24 episódios) consecutivos. Em 2021, o produtor de animação Okada ficou pela primeira vez na carreira a cargo desse tipo de produção em Blue Reflection Ray, e nessa ocasião o anime citado derreteu completamenteBaraou estava originalmente planejado para ir ao ar na temporada de outubro de 2021, mas foi adiado, o que aponta possíveis dificuldades de cronograma que a produção vinha (ou até mesmo talvez ainda venha) sofrendo. O maior conforto por enquanto é saber que os outros animes do estúdio para essa temporada são mortos em termos de produção, sendo Baraou aparentemente o de maior foco no momento — porém não no ano como um todo, em que provavelmente o usual maior foco irá para a nova temporada de DanMachi e para Shokei Shoujo no Virgin Road da mesma editora. 

E a outra parcela de culpa vai para as produtoras, quem banca esse projeto que resolveu que a staff deveria adaptar todos os volumes (que ficou bem claro que é essa a intenção) em 24 episódios. Sério, palavras não são o suficiente para expressar o quão triste e puto eu estou com o que está acontecendo aqui. Fazia muito, muito tempo que não ficava tão decepcionado e com raiva de uma animação. Reforço novamente que não atribuo a culpa maior para a staff.O diretor é bom. Ele fez coisas boas quando tem abertura e tempo para tal. Baraou cairia perfeitamente para ele, mas como que você dirige algo de forma que dê para mostrar seu potencial, se mal cabe todos os diálogos? Sério, tem momentos que os personagens dizem frases que sequer parecem conectar com o que está sendo passado na tela anteriormente.

Acho que o pior do anime, por parte da staff, foi o design. Eu não consigo gostar e muito da identidade visual se perde. Os tons de cabelo são todos iguais, sendo que no original há diferenças sutis ou até mais discrepantes, como no caso do Edward de Lancaster, que no mangá, o cabelo dele é laranja. É tudo muito simples e entendo que é para deixar confortável, mas nem nos closes mais próximos aos rostos os quadros são caprichados. Toda a essência da arte da Aya Kanno é perdida e fica só genérico e apático. Meu destaque mesmo acaba sendo para os cenários que são deslumbrantes!!!! Foi o que mais gostei aqui, de longe.


Concluindo aqui, fica claro que a staff realmente tentou fazer dar certo, só não teve como mesmo. A direção se esforçou, é nítido, porém não teve como salvar. Foi uma estreia apática e apressada de tal forma que se atropelou completamente, não conseguindo passar nem 10% do quão majestoso é o mangá e de tudo que ele têm a oferecer. Nem a apresentação dos personagens consegue ser feita de forma decente. Eu fico realmente TRISTE e PUTO, além de decepcionado com a adaptação, de uma forma que não fico há ANOS. E penso na AUTORA vendo no que transformaram a obra dela. Deve ser de um desgosto absurdo. Se nós que lemos e gostamos do mangá estamos terrivelmente decepcionados, imaginem quem criou o original.

Eu só não vou dropar, porque me comprometi a comentar semanalmente aqui no blog e é o que pretendo fazer. Entrei nesse barco e não pretendo pular (por ora). Porém, para vocês caros leitores, eu recomendo que não vejam caso não tenham visto a estreia e para aqueles que viram, dropem, sinceramente. Vão para o mangá, porque o anime não vai servir nem como uma boa introdução ao universo da série. Recentemente eu publiquei um texto aqui no blog apresentando um pouco do mangá e passando a recomendação e no momento, o melhor que vocês podem fazer é: ler o mangá.


E mais uma vez tomo um balde de água fria com um anime dessa temporada. Se houverem corajosos, espero que voltem para ler as demais postagens que seguirei fazendo sobre a animação. Vai ser uma tristeza enorme acompanhar esse anime, mas farei um esforço.