“Catch me if you can, Mr. Holmes”

“Catch me if you can, Mr. Holmes”

2020 foi um ano bem atípico e caótico em decorrência da pandemia. Posso dizer que boa parte das minhas experiências positivas daquele ano vieram com os animes que consumi e uma dessas animações é “Yuukoku no Moriarty”, vulgo meu anime favorito do ano passado! Depois de comentar seus 11 episódios, vamos falar mais uma vez de “Yuukoku no Moriarty”, afinal, nunca é demais exaltar a lenda!

Sinopse: “O protagonista da história é James Moriarty, o famoso antagonista da série Sherlock Holmes de Sir Arthur Conan Doyle. No mangá, ele é um órfão que assume o nome William James Moriarty quando ele e seu irmão mais novo são adotados na família Moriarty. Quando jovem, ele procura remover os males causados ​​pelo rigoroso sistema de classes da Inglaterra.”


“Yuukoku no Moriarty” foi uma das minhas experiências mais gratificantes de 2020, se tornando rapidamente meu queridinho do ano e sendo bem sincero, uma das melhores coisas que foi proporcionado no mundo dos animes (na vida foi basicamente só desgraça haha). Acredito que um dos motivos que me fizeram ficar tão cativado na obra é que “me prometeram” de que se tratava de um mangá bem mais ou menos/ruim e, por consequência, acabei levando essa mentalidade para assistir a animação. Entretanto o que me deparei foi algo completamente diferente do esperado, sendo MUITO melhor que a encomenda!

Eu quero destacar aqui o 1º episódio, porque ele é totalmente original (um “filler”), mas consegue introduzir muito bem o clima central da obra. O episódio é tão bem conduzido, tão bem montado e articulado, que quando eu o vi (na época não havia lido o mangá), acreditei que ali já era a adaptação do mangá propriamente. Tanto que tive um choque quando uma amiga me contou que o episódio não era baseado no material fonte. Ali mesmo deu para notar que a staff sabia exatamente o que estavam fazendo. Toda a parte mais cruel do ato foram deixadas subentendidas com nada muito explícito. Preferiram deixar o terror visual nas expressões faciais dos personagens, além do uso preciso da luz e sombra, juntamente com os cortes de edição extremamente bem encaixados. Tudo corroborou para um resultado incrível para a estreia do anime. E dali para frente foi uma crescente constante! A trindade de episódios iniciais abre e fecha um ciclo maravilhoso, com o episódio 1 introduzindo as principais ideias que serão abordadas na animação e do tom narrativo. O episódio 2 começa um arco de apresentação dos 3 personagens principais (Moriarty, Louis e Albert) e o episódio 3 fecha essa introdução, pegando as pontas mostradas nos 2 episódios iniciais e costurando tudo de forma impecável.

Depois da tríade de episódios introdutórios, temos a sequência de mais 2 episódios individuais contando pequenas histórias no estilo que disse mais acima. Em cada uma, apesar da causa ser semelhante, o decorrer é diferente dos demais, trazendo um crime bem diferente do outro apresentado. Você tem o caso de negligência médica e uma família que fica remoendo ódio por causa disso sem conseguir seguir em frente. E temos o caso de se livrar de uma pessoa por ela se envolver com alguém de outra classe social, o que é completamente condenável e inaceitável para os nobres. Os episódios 6 e 7 seguem mais ou menos essa mesma linha, com o diferencial que temos um arco nele e a introdução do Sherlock que chega para começar a atrapalhar a execução dos planos do Moriarty. É nesse arco também que vemos ainda mais do quão longe uma pessoa pode ir para fazer algo que ela considera entretenimento e o quão superior ela acredita ser apenas por ter dinheiro. Outro ponto que vale destacar desse arco é que ele mostra que o Moriarty está mirando nos nobres, porém não ignora outros problemas e que pode muito bem usar pessoas que são verdadeiras escórias para articular seus planos.

Você pode estar se perguntando “E aí, o que a série tem de mais?”. Pois bem, ao contrário do que temos usualmente, “Moriarty” não vai mostrar a perspectiva do ‘herói’, do cara que vai buscar justiça pela lei (como deve ser feito). Ele vai te dar a visão do antagonista, do cara que vai ir pelos meios alternativos. Esse é um dos motivos que gostei tanto dele. Desde cedo sempre tive uma tendência a gostar mais dos vilões do que dos heróis. Achava os “caras maus” mais interessantes, principalmente por pensar no que os teria motivado a cometer tais atos. É muito cativante para mim. Yuukoku no Moriarty traz muito disso, de explorar as motivações, os objetivos e a cabeça dos personagens. Se formos trazer para a realidade, nada é simples, ou nada vai ser “preto ou branco”, ou casos como dividir pessoas por “boas e más”. O mundo e o ser humano é muito complexo para avaliar somente nisso. Por exemplo, se tem uma tendência a achar que um assaltante está fazendo aquilo por ganância ou porque não quer trabalhar, coisas do gênero, sem tentar entender o que o levou a chegar naquele ponto. Raramente se busca tentar entender o que ocasionou aquilo. Pode ter sido falta de oportunidade ou ter que sair da escola para poder trabalhar e ajudar em casa, o que mais tarde gerou uma cobrança do Ensino Básico completo. Às vezes uma situação extrema que a pessoa pode ter como uma família para alimentar e não consegue emprego o levou ao tal ato criminoso. Tem questão de que se ela é presa e quando é solta, dificilmente irá conseguir um trabalho, porque você ter uma passagem pela polícia, tendem a isolar essas pessoas da sociedade, não restando alternativa a não ser voltar a fazer para mesma coisa que o levou a prisão. ENFIM, o que eu queria chegar é que a realidade é muito complicada. Ter um cenário de séculos atrás com leis mais frágeis ou inexistentes, ao mesmo tempo que uma minoria comete crimes diversos enquanto sai impune, faz com que sujam personagens como o Moriarty que quer tentar mudar o status social.

E por se passar ainda no século de XIX (19), as leis são mais frágeis para o lado da parte massiva da população. Você não tem leis trabalhistas ou legislação que imponham limites do aceitável para essa grande parcela da população. O resultado disso é bem claro: os nobres vão usar e abusar dessas pessoas. Como não tem “nada” que vá trazer grandes consequências, as vitimas não farão falta para a sociedade e apenas os familiares ou pessoas mais próximas sentirão todos os danos. Moriarty também não está exaltando as ações dos protagonistas dizendo coisas como: “Olha, isso daqui é o certo”. Está longe de ser a mensagem principal. O que a obra quer trazer é uma circunstância em que você sinta dualidade. O anime quer te colocar nessa via de mão dupla, porque todas as situações são feitas para você não sentir empatia com a burguesia e quando chega no momento da morte, é para que você não se importe com o criminoso rico. E um exemplo de que a obra não quer se colocar como certa é que em um determinado momento, os próprios personagens comentam entre si que seus atos não estão indo pelo caminho correto. Eles “não são dignos” nas palavras deles. MAS isso não impede de que por vezes, você possa pensar que o personagem X, Y e X “mereceu” o fim que levou. É isso que o anime/mangá quer fazer. Para você pensar naquilo tudo e se sentir numa balança de escolhas.

Essa questão também vale para o Sherlock. Ele vai ser como o “mocinho” da história, mas isso não impede dele ter movimentos questionáveis também. Não vou entrar em detalhes, mas digamos apenas que ele também tem seus próprios interesses e vai agir de forma que consiga alcançar seus objetivos com a pura finalidade de se entreter, independente de quem está envolvido na história. O enredo também vai agir de modo que você ‘se afaste’ do Sherlock. O autor coloca o personagem de um modo que você não sinta tanta afinidade por ele, ao mesmo tempo que está lá vendendo carisma do elenco principal, afinal, seria muito difícil você ler ou assistir o negócio se não gostar do elenco. Ele não quer defender ideais, entretanto precisa colocar de maneira que você se prenda aos personagens e acredite. E nisso o autor faz muito bem hahaha. Acredito até que seja por o motivo que algumas pessoas não gostem tanto do Sherlock daqui, porque o autor quer justamente te afastar dele.

E já que estamos falando do personagem, os dois últimos arcos da animação (2 episódios cada) o envolvem mais. Temos um que servirá como um experimento para testa-lo, enquanto vemos que o mocinho não é tão inocente assim e que ele pode sim, cometer erros e ser egoísta, buscando coisas que são apenas para o entretenimento próprio. Já o último arco mostra mais da dinâmica do Moriarty com o Sherlock, produzindo uma cena simplesmente memorável no episódio 10, vulgo melhor episódio da série.


Partindo para comentários mais gerais, acho o conjunto da obra muito bom. São muitas qualidades com os problemas acabam sendo pontuais. Mesmo esses erros, ao menos para mim, acabam sendo cobertos pela quantidade de acertos da animação. Ela corta algumas coisas do mangá, chega a pular um arco inteiro e altera outras, porém eu não sinto falta de nada vendo a adaptação por si. Mérito também da direção que consegue trazer um clima todo especial para o anime, sabendo usar ângulos, olhares, movimentações e closes nos momentos certos, tudo casando perfeitamente com o anime que tende a ser mais “parado” por causa do estilo de narrativa adotado. Inclusive, é por ele ser mais “calmo” e estático que acredito que a produção consegue deixar os designs mais detalhados. Takes mais próximos são cheios de sombras e os olhos são muito lindos. O filtro usado realça a beleza deles e no contexto da animação. É muito bom, porque usam muito os olhares para transmitir os sentimentos dos personagens, não fazendo a necessidade de verbalizar. Por fim, eu sempre acho interessante deixar as letras de abertura e encerramento dos animes, porque tenho para mim que algumas delas podem contar mais de suas personagens, servindo de complemento para a história. Vocês veem a letra da música logo abaixo:

DYING WISH – por Tasuku Hatanaka (Abertura)

A névoa esconde o pecado
Em minhas mãos tenho a lista do julgamento
Vou cometer o crime perfeito e enterrá-lo numa cista
Este é o desejo de morte à você
[Coloque um ladrão para pegar outro ladrão]
O choro de alguém
[Coloque um ladrão para pegar outro ladrão]
Foi crucificado e ridicularizado
Um mundo sangrento, uma distopia sem luz
Flores não nascem aqui
[Coloque um ladrão para pegar outro ladrão]
Somos oprimidos
Temos que levantar e acabar com isso
Que o fim comece!!!

Quebre-o para aliviar sua alma
Seu coração vai acordar e reviver
Lorde do Crime
Sacrifício de seus ideais
Mesmo que seja queimado, a liberdade é eterna

ALPHA – por STEREO DIVE FOUNDATION (Encerramento)

Mentira! Seja resoluto se você irá dividir sua dor
Demonstre sua determinação
Goste ou desgoste, você não pode se dar ao luxo de se importar de qualquer jeito
Isso depende do objetivo
[Tornar realidade é o mais importante]
O mal necessário do auto-sacrifício é uma causa justa que ninguém pode entender
Tenha orgulho dos laços invioláveis compartilhados entre irmãos que comentem o mesmo crime
Faça uma chance engatilhar sua posição inevitável e se embriague com seus efeitos no final
Não acredite no que você pode ver, na verdade não tem sentido saber
[Tudo que for necessário]
Adie pela própria invalidez, você tem apenas um objetivo
[Deixe-me escutar você falar]
Você não pode mentir para si mesmo, venha junto de mim
É tudo por não haver uma resposta
Não há caminho de volta

Sobre a abertura, ela mostra a realidade daquela sociedade, enquanto também nos diz como funciona os meios usado pelo Moriarty para mudar ela: “Coloque um ladrão para pegar outro ladrão”. Criar situações para que eles mesmos se consumam, se destruam, enquanto ele pode muito bem passar despercebido. Em paralelo a isso, a música também pontua sobre as crueldades que pessoas pobres sofrem: “O choro de alguém”; “Foi crucificado e ridicularizado”; “Um mundo sangrento, uma distopia sem luz”. Até o momento que resolvem colocar um ‘basta’ nisso e começar a agir, indo contra a maré da minoria que controla e oprime a maioria da população, mas que tudo isso tem um preço a se pegar (e eu fico com medo desse preço ser a morte). Eu adoro essa música. Ela é muito boa.

Na outra ponta temos o encerramento que a música diz muito coisa, mas a animação também serve com uma boa adição para o que está sendo passado para nós. A música mostra o desejo do Moriarty, Louis e Albert de tornar seus ideais uma realidade. Enquanto isso, na animação, temos os três pintando paredes. A composição é muito alegre, com cores vivas e eles se divertindo com isso. Ao final da cena temos o resultado da pintura dos três. São quadros cheios de vidas, com paisagens bonitas, que eu acredito ser a idealização da sociedade para eles. Um lugar ideal e bonito em que todos vivem em igualdade, como uma utopia mesmo. Um adendo importante é que nessas cenas, os 3 ainda são crianças, sendo bem aqueles sonhos de infância que nós temos quando não temos muita noção da realidade. Tudo parece ser mais fácil de alcançar e se esvai, ou pelo menos vamos percebendo que a realidade não é tão fácil como parecia, sendo esse justamente o momento em que a cena corta para eles já adultos, com caras tristes em um lugar mais gélido com cores mais frias. A música termina com o verso: “Não há caminho de volta”. Ou seja, o caminho que eles escolheram, a defesa de seus ideais, mostra que não tem mais como voltar atrás.

Eu não gosto de ficar pensando muito além disso, porque tanto o final da OP como a ED me deixam com a impressão de que as escolhas deles vão resultar em morte… Eu não quero isso. Eu gosto deles hahaha.


Bom, acredito que seja isso. Acho que comentei tudo que eu queria, sendo mais abrangente nos meus comentários, só para fechar o que achei da temporada como um todo. Quem quiser comentários mais detalhados temos postagem para os 11 episódios. Só pesquisar no campo de busca “Yuukoku no Moriarty” que vocês vão achar. Tem resenha do volume 1 do mangá também caso se interessem (leia aqui). Essa postagem deve estar sendo lançada no dia 25 de Março quando faltam exatamente 10 dias para a estreia da 2ª temporada do anime no Japão. Por fim, caso não tenham visto, o anime continuará sim sendo comentado episódio por episódio nessa season :). Muito obrigado por lerem até aqui. Comentem o que vocês acharam, porque só enriquece a postagem. Até logo mais ^^

Deixe um comentário