Em janeiro de 2019, a Etsuko, uma autora que até então, era muito desconhecida, mesmo considerando o ocidente como um todo, chegou ao Brasil com “JOY”, que na época, era o trabalho mais recente da autora. Em novembro de 2020, a autora estava de volta com “JOY Second”, a sequência de “JOY”. Anos se passaram e apesar do claro sucesso de JOY e da sua sequência, a autora permaneceu abandonada, até ter seu retorno anunciado em meados de 2023 com as obras “In the Apartment“, trabalho um pouco mais antigo da autora, e “Melon no Aji“, que é o seu trabalho mais recente lançado em revistas no Japão. Embora “In the Apartment” (que será lançado como “No Apartamento”) siga sem previsão, “Melon no Aji” está sendo publicado (quase 2 anos depois do anúncio) sob o título “O Sabor de Melão”, com o volume #1 tendo sido lançado no final de junho e o 2º previsto para este final de agosto.
“O Sabor de Melão” foi publicado no Japão entre janeiro de 2020 e julho de 2021 na revista ihr HertZ da editora Taiyohtosho, sendo concluído em 2 volumes (lançados simultaneamente no Japão). No Brasil, o mangá sai agora, mas na França, os dois volumes do mangá foram lançados em abril de 2023 pela editora Hana com o título “Le goût du melon”. Irei falar do mangá a partir da edição francesa. ^^

Sinopse: “Nakajou, que trabalha como garçom em uma casa de shows, de repente se vê hospedando Kiuchi, um cliente que acabou de ser abandonado pela namorada e jogado na rua. Os dois homens não se conhecem muito bem e ambos têm situações pessoais complicadas, mas Nakajou logo percebe que a vida com Kiuchi é muito mais fácil do que imaginava.
Uma estranha familiaridade logo se desenvolve entre os dois, mas Nakajou está em um relacionamento com outro homem, enquanto Kiuchi está sempre pensando na ex-namorada e parece esconder muitos detalhes de sua vida do novo colega de quarto…”
- História e Desenvolvimento
A história começa com o Nakajou sendo convencido pelo chefe a aceitar o Kiuchi na sua casa. O Kiuchi acabou de terminar com a namorada e como era a casa dela, ele está sem moradia. Com relutância, pois o Nakajou prefere viver só a ter alguém desconhecido em casa, ele acaba aceitando e os dois saem para beber um pouco. O Kiuchi é um homem de 30 anos e é uma pessoa que chora com muita felicidade (muita mesmo). Já o Nakajou tem 25 anos e o grande motivo para ele recusar a vinda do Kiuchi inicialmente, além da dificuldade de convivência, era por ele ser gay e estar em um relacionamento (e o Kiuchi é hétero). Fato é que os dois acabam se dando muito bem e ajustando a presença um do outro, passando a conhecer mais sobre a vida deles e os seus dramas internos.

– Eles são todos casados.
– Para uma garota então…?
– Eu não posso… eu acabei de terminar, é muito cedo.
– Você vai ver, Kiuchi é um bom garoto.
– É verdade!
– Então, Nakajou? O que você diz?
– Ok…
O mangá parte de uma proposta simples com duas pessoas que não mal se conhecem passando a viverem juntas. E com o passar dos capítulos, vemos alguns aspectos da vida dos dois: o Kiuchi, por algum motivo, tem um problema de não conseguir (ou ter muita dificuldade para conseguir) dormir sozinho, pedindo para que os dois durmam na mesma cama em alguns momentos. Já o Nakajou tem dois problemas principais na sua vida: ele não se dá bem com os pais, desde que souberam que ele é gay. E a outra questão que aflige sua vida naquele momento é que o seu relacionamento está completamente falido.
O Nakajou vive em um prédio que é dos pais dele e a sua mãe paga todas as contas, sendo isso o que permite a ele viver em um espaço bem grande e com um trabalho que pague tão pouco. A mãe dele cobrir esses custos está associado a se sentir culpada por ele ser gay, como se o problema fosse ela (e ele, por consequência, tivesse algum problema também), o que por sua vez também gera conflitos no casamento dela com o pai do Nakajou. Já no campo do relacionamento, ele namora com um cara que não se importa com ele e que na hora do sexo, faz o que bem entende sem nem se importar com o parceiro e o seu bem-estar. Por ele não aguentar o sexo, o namorado usa isso como justificava para o trair com outros rapazes. E embora ele diga que estão namorando, nesse ponto da história, eles já estão com tudo praticamente terminado e a convivência com o Kiuchi vai servir para abrir seus olhos e colocar um ponto final nessa história dos dois.


– …… Como assim “e então”? Você não ouviu o que eu disse?
– Hein? Espere, é esse o seu motivo? Você poderia ter dito mais cedo!
– Eu acabei de te dizer!
– Ah! Entendi! Você tem um namorado! Então é delicado dormir com outro homem!
– Não, isso não tem nada a ver… esse é meu problema. É, sobretudo, por você. O que você fará se eu ficar excitado?
– Sem problemas!
Da mesma forma que o Nakajou tem interesse em saber mais da vida do Kiuchi e, principalmente, do seu relacionamento com a namorada, que foi muito efêmero, durando apenas 3 meses , e das outras garotas que ele tinha relacionamentos (todos casuais de uma noite). O Kiuchi diz que para o perfil/padrão dele, de alguém que não consegue se conectar com as pessoas e manter relacionamentos por longos períodos, 3 meses é muito tempo para ele. E na mesma lógica, o Kiuchi também cria interesse no relacionamento dele com o namorado e em como é se relacionar com outros homens e bem… quem acompanha BL já sabe onde essa história vai parar: começa com uma mãe amiga na hora da ereção… vira um pedido de beijo… e quando vê, pimba, tá na cama com o homem.

– Eu posso te beijar?

– Se você diz…
* Essa frase, eu teria amado ouvi-la do meu namorado… mas foi ele quem a disse *
Essa parte do ir para cama vai levar um tempo ainda (rs), mas fato é que a relação deles vai ficando cada mais próxima e íntima. O Kiuchi é o personagem hetero que vai se encantando pelo personagem gay e no caso dele, diz que sente que apenas queria dar prazer para ele, vide que ele não tinha com o então namorado. Essa relação que é de colegas de quarto, amigos e amigos que às vezes fazem coisas sexuais (tudo meio nebuloso), vai criando um senso no Nakajou de perceber o quão ruim o namorado era, já que o Kiuchi que ele conheceu há pouco tempo, o trata com muito mais respeito, cuidado e carinho do que o namorado.
Esse relacionamento nebuloso vai criando tanto uma noção de confiabilidade e companheirismo grande um no outro, ao ponto que o Nakajou aos poucos vai sentindo ciúmes pelo Kiuchi (que é outro evento canônico na vida do gay). Ocorre que os dois acabaram tendo um “encontro de almas” enorme, já que os dois são pessoas solitárias e estavam em momentos de solidão, encontrando um conforto genuíno justamente por serem completos estranhos um para o outro (o sexo entre eles representa isso). Mesmo que comecem a adentrar mais na vida um do outro, eles ainda conseguem agir tão naturalmente e encontrar esse aconchego, porque muitas vezes, é mais fácil contar algo ou desabafar para um estranho do que para alguém que conhece a gente há muito tempo. O aspecto da solidão é algo que a autora consegue mostrar e expressar bem, principalmente nos cenas à noite, em que ela usa o silêncio e a contemplação do vazio (das ruas, da casa, dos ambientes…) como forma de inquietação dos sentimentos dos personagens.

Tudo isso que falei foi um pouco do que rola ao longo do 1º volume. No segundo volume, o mangá entra mais na vida do Kiuchi e do passado dele. Tem um plot envolvendo o personagem, que a autora vai construindo aos poucos ao longo do volume, deixando pistas por meio de dúvidas e inquietações do Nakajou. Não vou entrar em detalhes, já que a graça é descobrir lendo, o sentimento de entrar nesse plot é algo bem “especial”, eu diria, mas eu gostaria de dizer que gostei do final que a Etsuko deu para os personagens. Sinto que se ela quisesse poderia ter ido até um pouco mais longe e realizado um desejo que o Nakajou expressa ter ao longo da história, mas no ponto que ela decide terminar, é, também, muito bom! ^^
A história é um drama do cotidiano convincente, e a meu ver, a Etsuko tem se tornado cada vez melhor nesse tipo de história. “JOY”, pela característica da revista, tinha uma história mais “para cima”, com dramas que são mais “banais” e aqui temos algo mais denso, mais complexo de se lidar e resolver, o que também reflete no clima da série que é mais sóbrio e com uma atmosfera mais pesada (embora ainda com aquele humor super gostosinho, bem característico da autora). É um pouco o sentimento que tive ao ler “No Apartamento” alguns anos atrás e tenho a impressão de que a autora tem melhorado cada vez mais nisso! Desde o final de 2022, quando a autora terminou “Happy Magical NIRVANA” (BL volume único ainda inédito no Brasil) ela não publicou mais nada em revista (atualmente, ela tem publicado uma série doujinshi chamada “IRUKA”) e sinto falta de novos trabalhos. Espero que ela ainda volte a lançar novas obras, pois ela é boa e sinto que o tempo tem dado uma maturação excelente ao trabalho dela, tanto artisticamente como em termos de roteiro.

Assim como no Japão, lá na França, os 2 volumes da obra foram lançados de forma simultânea e lendo o mangá, acho que ele funciona melhor quando se lê de uma vez. Então recomendo tentar esperar sair o volume 2 e ler os tomos seguido um do outro. E aliás, logo que terminei o 1º capítulo já me bateu um baita arrependimento de não ter lido o mangá antes. É um mangá gostoso e fluido de ler. Meu francês é intermediário (um intermediário quase indo para o básico) e normalmente, tenho dificuldade de ler certas obras e “Le goût du melon” consegui ler até com certa tranquilidade, terminando os volumes bem rapidamente.
- A Arte
A meu ver, a Etsuko está no seu auge até agora. Ela está com um estilo de pintura diferente nas ilustrações coloridas, diferente do que estamos mais habituados com “JOY”, por exemplo. No miolo, o estilo segue característico dela, com a quadrinização feita com quadros e retângulos largos e em pouca quantidade por página (o que se chamaria de “simples”), com aquele humor de chibis e expressões que são característicos do estilo da autora. Sempre adorável de ver!


- A edição francesa
Na França, o mangá foi publicado pela Hana no formato 12,8 x 18,2 cm (formato muito semelhante ao que “JOY” foi lançado aqui), com sobrecapa fosca. Tem páginas coloridas em papel couché brilho e no miolo, não se sabe, mas é semelhante aos papéis do tipo Pólen daqui do Brasil. Possui uma média de 170 páginas por volume e preço de capa de 7,95€. Abaixo, o vídeo mostrando os dois volumes da edição francesa. ^^
Eu não comprei a edição nacional, então não posso dizer como ela está (em termos de acabamento, deve seguir o padrão da editora, isso é a única coisa que dá para afirmar). Mas queria dizer que achei esquisita a escolha da preposição do título “O Sabor DE Melão” ao invés de “O Sabor DO Melão” sempre me causa um estranhamento na hora de falar o título.
- Conclusão
É muito bom ver a Etsuko de volta ao mercado nacional, mesmo com a demora da editora que publica a autora por aqui. Espero que esses “novos” mangás dela que estão chegando no Brasil conquistem o público tanto quanto “JOY” conquistou e cativou. Se eu fosse dizer, creio que esse seja o melhor mangá dela até agora (pelo menos entre os que li) e recomendo fortemente a obra.
Por fim, gostaria de dizer que a resenha está sendo feita em dedicatória a seguidora @taxislunar que me pediu MUITO por ela. ^^

- Ficha Técnica
- Título original: Melon no Aji (メロンの味)
- Título nacional: O Sabor de Melão
- Título francês: Le goût du melon
- Autora: Etsuko
- Serialização no Japão: ihr HertZ
- Editora japonesa: Taiyotosho
- Editora francesa: Hana Éditions
- Quantidade de volumes: Completo em 2 volumes
- Formato francês: 12,8 x 18,2 cm; capa cartonada com sobrecapa
- Preço de capa: R$ 42,90 (impresso nacional)/ 7,95 € (impresso francês)
