Olá pessoal! Vamos aqui ao texto de apresentação do mês de Novembro (que está saindo em Dezembro, por razões adversas, alheias a minha vontade) e dessa vez com um mangá Shoujo! Para quem não sabe, mês a mês (ou pelo menos eu tento que seja todo mês), escolho um mangá (as vezes é mais de um) para escrever uma pequena resenha aqui no blog. A ideia é selecionar mangás de demografia feminina que não são licenciados no Brasil (principalmente) e que sejam pouco conhecidos ou que estão em um momento legal para serem comentados. Em setembro desse ano, por exemplo, o mangá escolhido foi “Hoshi Furu Oukoku no Nina“, pois em Outubro teríamos a estreia da adaptação em anime.
“Rouge Éclipse” foi publicado no Japão entre setembro de 2014 e novembro de 2015 na revista Bessatsu Margaret (Shueisha) sob o título “Sora wo Kakeru Yodaka” (宇宙を駆けるよだか) e completo em 3 volumes. A obra é escrita e ilustrada pela Shiki Kawabata, uma autora que gosto muitíssimo e que na época, estava bem no comecinho da sua carreira como mangaka e sendo esta a sua primeira série, tendo mais de um volume O mangá ficou em 5º lugar no ‘Kono Manga ga Sugoi! 2015’. Foi lançado na França entre agosto e dezembro de 2016 pela Akata e foi o primeiro trabalho da autora lançado na França (de lá para cá, a editora também publicou “Hakoniwa no Soleil” (Le secret de l’Ange) e “Sekai de Ichiban Hayai Haru” (Ce Printemps Rémanent)).
Para falar do mangá no blog, estarei utilizando o primeiro volume da edição francesa. ^^
Pois bem, “Rouge Éclipse” conta a história da Ayumi, uma garota linda, tem uma família acolhedora e alegre. Ela se vê em um cenário ideal, pois o garoto que ela gosta, Shirô, se confessou para ela e eles começaram a sair. O mangá começa já nesse encontro dos dois e naquele dia, na cidade que eles vivem, Akatsuki, será possível ver o eclipse lunar da Lua Vermelha. Um pouco antes do encontro começar, porém, ela recebe uma ligação da Zenko Umine, uma colega de sua classe, dizendo que ela vai se suicidar. A Zenko está no alto de um prédio, com a Lua Vermelha atrás, a Ayumi ao olhar a cena da Zenko se atirando do prédio, desmaia e ao acordar no hospital, para sua completa surpresa, ela se encontra no corpo da Zenko. Agora, a Ayumi, no corpo da Zenko, precisa descobrir o que está acontecendo e reaver seu corpo e sua vida de volta.
Se a Ayumi tinha uma vida perfeitamente ordinária, mas sem grandes dificuldades ou ‘pesadelos’ por assim dizer, ela logo vai conhecer o completo oposto de tudo que já vivenciou estando no corpo da Zenko. A Zenko é uma aluna rejeitada, baixinha, gorda, vista como feia e estranha, tem uma mãe que é frustrada e desconta absolutamente tudo nela ao menor sinal, além de sofrer das mais diversas agressões e violências de colegas e professores na escola. Gosto muito que nesse primeiro momento de entendimento e de absorção das coisas, a Ayumi vai tomando baque atrás de baque, especialmente porque ela vivencia coisas que nunca antes ocorreram (como o assédio do professor da turma) e que mesmo ela estando na mesma sala e presenciando esses ocorridos, ela nunca os percebeu ou mesmo ligou. No entanto, agora estando ela na pele da Zenko, passa a prestar atenção nesses “detalhes” que antes lhes eram tão alheios. Tem uma página que representa isso muito bem em que a Ayumi reflete sobre como aquela ainda é a mesma escola, os mesmos colegas, mas tudo parece completamente diferente. Ela é ignorada por todos, ninguém fala com ela, vive isolada, ninguém verdadeiramente se importa e mesmo suas amigas a olham de forma estranha (considerando que a veem como a Zenko). É nesse momento que ela percebe a crueldade que existe por de trás de tudo aquilo.
Nesse ponto da história (e aqui, estou tratando apenas do capítulo 1), também começamos a ver o ponto de vista da Zenko que agora está no corpo da Ayumi. Ela é quem causou a mudança e não quer abdicar daquele corpo e daquela vida, especialmente porque agora está tendo experiências que ela sempre quis ter: ser bonita, ter amigos, um namorado e por aí vai. O mais interessante nessa história toda é que, por mais que ela agora “seja” a Ayumi, ocupe o lugar dela e tente emular tudo (o que ela faz muito bem), ela continua não sendo a Ayumi e claro, nem tudo vai sair como ela quer. Da mesma forma, a Ayumi no corpo da Zenko, mesmo comendo o pão que o diabo amaçou no começo, com o jeito dela, em personalidade, a certa altura, começa a mudar a forma com a qual as pessoas a veem, atraindo pessoas, o que de certa forma, é a obra dizendo que não importa o quanto você queira roubar a vida de alguém, tem algo de intrínseco em você que, se você não percebe e tenta mudar, a raiz do problema vai continuar. Enfim, parte de um ponto de que alguns casos e situações não é sobre o outro, mas sobre você mesmo. Claro, não é que a autora está dizendo que todos os problemas que a Zeniko enfrenta são culpa ou de responsabilidade inteiramente dela, especialmente porque a autora mostra o senso de crueldade das pessoas e como isso muda a depender do estado e momento que você está, o que nos leva a questão de que não importa quem você é realmente, mas sim, sua aparência.
Tem outro personagem que se insere nessa história de uma forma muito interessante, porque de novo, vai trazer a ideia da inveja. Quando você olha o personagem, ele claramente está dentro de um espectro de alguém que já “tem tudo”, que não tem muito o que reclamar ou mesmo invejar, no entanto, como já se dizia no ditado popular: a grama do vizinho é sempre mais verdinha. E por fim, o outro grande destaque é o Kaga, que é um amigo da Ayumi e vai se juntar a ela na investigação do que está acontecendo, bem como uma forma de devolver o corpo da Ayumi de volta.
A narração da Shiki Kawabata é muito boa. Ela conduz o volume excelente, sempre com esse clima de mistério e gosto muitíssimo de como a autora vai introduzindo novos elementos, peças e personagens nessa história para alimentar ainda mais esses mistérios que giram em torno da troca de corpos. Ela se utiliza dessa mudança para conversar sobre outros assuntos, como a já citada inveja. Quase todo capítulo há alguma reviravolta ou elemento que tornam a história ainda mais interessante. É um primeiro volume formidável e estou bem animado para ver onde a autora irá nos levar daqui em diante.
Como eu disse lá no começo “Rouge Éclipse” (Eclipse Vermelho) foi a primeira série da Shiki Kawabata e aqui, o ponto principal da autora parte da crítica a sociedade das aparências, a inveja, o assédio, o como nunca estamos satisfeitos com nossa própria imagem e há sempre uma busca por algo melhor ou ideal, mas também, de certa forma, uma certa hipocrisia das pessoas. A Shiki Kawabata, mesmo antes de eu ter a oportunidade de ler seus trabalhos, foi uma autora que me chamava atenção, pois todos os seus mangás partem de propostas interessantes. São títulos variados e frequentemente, com algum tipo de crítica social. Por exemplo, em “Le secret de l’Ange”, a autora nos apresenta um thriller abordando temas como o luto, a memória e o perdão, enquanto que em “Ce Printemps Rémanent”, ela trabalha com viagem do tempo e toques de mistério e suspense psicológico, explorando especialmente o arrependimento pelas ações tomadas.
Falando na carreira da Shiki Kawabata, ela começa sendo assistente da Io Sakisaka, autora de grandes sucessos como “Aoharaido – A Primavera de Nossas Vidas” e “Furi Fura – Amores e Desenganos” (ambos lançados no Brasil pela Panini). Ela debutou profissionalmente em agosto de 2012 na revista bianca (Shueisha), com o one-shot “08:05 no Hengao-san“, sobre um garoto e uma garota que se cruzam todos os dias, no exato mesmo horário, em seus trajetos para a escola, até o dia em que algo muda. Nesse primeiro momento da sua carreira, ela publicou alguns one-shots em algumas revistas da editora Shueisha e em 2013, ela lança “Ao ni Koubou” (inédito na França), uma coletânea de histórias curtas publicadas na Bessatsu Margaret Sister (Shueisha) e no mesmo ano, ela estreia com sua primeira série longa, “Sora wo Kakeru Yodaka” (aka “Rouge Éclipse”), em 3 volumes. Em 2018, foi lançada uma adaptação em live-action em 6 episódios pela Netflix, está disponível sob o título “Switched“. Em fevereiro de 2016, ela estreia “Hakoniwa no Soleil” (Le secret de l’Ange) e foi publicado até maio de 2017 na Bessatsu Margaret (Shueisha). Em 2018, ela começa duas novas obras: “Sekai de Ichiban Hayai Haru” (Ce Printemps Rémanent) e “Boku no Orion” (ainda inédito na França). “Sekai de Ichiban” foi publicado na revista Kiss, marcando a primeira parceria dela com a Kodansha, e foi concluído em 2021 com 5 volumes. “Boku no Orion” foi publicado até agosto de 2021 na revista Cocohana (Shueisha). Atualmente, a Shiki Kawabata publicada “Komorebi no Hito” (também inédito na França) na revista FEEL YOUNG (Shodensha). O mangá está em publicação desde 2023 e atualmente conta com 3 volumes lançados.
Lendo “Rouge Éclipse” é evidente que desde cedo a Shiki Kawabata tem um ótimo controle narrativo e na composição das cenas. Tem páginas que são lindas, não exclusivamente por uma beleza artística, porém também pela montagem. E sendo uma história de suspense, ela sabe criar cenas e momentos bem propícios e oportunos. ^^
“Rouge Éclipse” ou “Sora wo Kakeru Yodaka” é um ótimo Shoujo de mistério e suspense, com uma ponta de crítica social. Gostei muito do que li nesse volume e é uma ótima opção para quem busca histórias de suspense, ainda mais sendo pensadas por e para um público feminino, o que é sempre muito mais interessante de se ver. Dentro desse tipo de narrativa, também deixo a recomendação para “Watashi no Otto wa Reitouko ni Nemutte Iru“, que também já fizemos texto aqui no blog, que fala sobre uma mulher que após as constantes agressões do marido, o mata e, no entanto, no dia seguinte, ele aparece vivo na frente dela…
Abaixo, vocês veem o vídeo mostrando a edição nacional do mangá e logo em seguida, a lista com todos os textos de apresentação que já escrevi aqui no blog. ^^
- A sign of Affection (Yubisaki to Renren);
- À tes côtés (Hananoi-kun to Koi no Yamai);
- Switch me On (Honnou Switch);
- Goodbye my Rose Garden (Sayonara Rose Garden);
- Le Requiem du Roi des Roses (Baraou no Souretsu);
- Perfect World;
- Les Chroniques d’Azfaréo (Azufareo no Sobayounin);
- Sasaki et Miyano (Sasaki e Miyano);
- Ocean Rush (Umi ga Hashiru Endroll);
- Burn the House Down (Mitarai-ke, Enjou suru);
- Good Morning, Little Briar-Rose (Ohayou, Ibarahime);
- Cherry Magic;
- Veil;
- Mon mari dort dans le congélateur (Watashi no Otto wa Reitouko ni Nemutte Iru);
- Canção do Amanhecer (Yoake no Uta);
- Vampeerz;
- Entre nos mains (Kakeochi Girl);
- L’histoire de papa, papa et moi (Boku no Papa to Papa no Hanashi);
- Whispering – Les voix du silence – (Hisohiso -Silent Voice-);
- & (AND);
- Nina du Royaume aux étoiles (Hoshi Furu Oukoku no Nina);
- Don’t Fake your Smile (Niji, Amaete yo.);
- FANGS;