Shoujo Dark Fantasy? Temos sim!
Começamos um novo ano e continuamos com a nossa série de apresentações de mangás Shoujo, Josei, GL/Yuri e BL aqui no blog. Para quem está tendo contato com o projeto pela primeira vez, basicamente é uma ideia de uma vez por mês, apresentar um mangá dentro dessas demografias, dado que elas são mais ignoradas e excluídas no mercado. É apresentar bons mangás que sirvam tanto de recomendações de leitura, como um incentivo para o público pedir esses títulos para as editoras brasileiras, como também, quem sabe, servir como um indicativo para as editoras ficarem de olho ou que achem interessante ao menos dar uma olhada. Nessa série, já comentamos e recomendamos os mangás: “Yubisaki to Renren” (Shoujo), “Hananoi-kun to Koi no Yamai” (Shoujo), “Honnou Switch” (Josei) e “Sayonara Rose Garden” (Yuri). E hoje o título da vez é “Le Requiem du Roi des Roses“, que eu estou aproveitando a estreia do anime agora no dia 9 de Janeiro para introduzir a série ^^
“Le Requiem du Roi des Roses” é publicado no Japão originalmente sob o título “Baraou no Souretsu” (薔薇王の葬列), sendo escrito e ilustrado por Aya Kanno. A obra teve sua estreia em Outubro de 2013 na revista Monthly Princess, da editora Akita Shoten. O mangá será concluído na edição de Fevereiro/2022 da revista, a ser lançada no Japão no fim deste mês de Janeiro. O título tem 16 volumes publicados até o momento e será concluído no volume 17, a ser lançado em Junho de 2022. Em 16 de Março, um fanbook da série será publicado, contendo conteúdos extras, capítulos e artes da autora ^^. Um arco extra para a obra será iniciado na edição de Abril/2022 da Princess, que será lançada em Março, esse arco terá como base histórias que não foram contadas durante a série principal. Aya Kanno, para quem não lembra, é a mesma autora de “Otomen“, mangá que começou a ser publicado no Brasil pela Panini em Setembro de 2009, mas que acabou sendo cancelado, tendo apenas 7 (de 18) volumes lançados no país.
Para apresentar “Baraou no Souretsu” para vocês, estarei usando como base o volume 1 da edição francesa. Ignorem o “Seinen” escrito na capa do mangá. É uma categorização feita de maneira intencional pela editora francesa, porque se fosse indicado como “Shoujo”, dizem que não venderia… Enfim, questões para outros posts e outra hora… Ah, é importante dizer que seguirei os nomes usados na edição francesa. Então teremos algumas variações como “Édouard”, que é “Edward/Eduardo” e assim por diante.
Antes de uma apresentação da sinopse da obra, eu tenho uma pergunta: qual é a figura que você tem quando se trata de “Mangá Shoujo”? Romance água com açúcar? Escolar? Vejamos, não é totalmente errado em associar o shoujo ao romance, já que esse gênero caminha de mãos dadas com a demografia. MAS é importante ressaltar que a demografia em si não é apenas isso. Há uma gama de outros gêneros que permeiam dentro do shoujo. Da mesma forma que o Shounen não é apenas mangá de lutinha, o Shoujo não é apenas um mangá de romance escolar. Esse é o caso de “Le Requiem du Roi des Roses”, um ‘Shoujo Dark Fantasy’ que é uma reinterpretação das peças de Shakespeare Richard III e Henrique IV, que tem como enfoque a Guerra das Duas Rosas (1455-1485).
“Le Requiem du Roi des Roses” é protagonizado por Richard, terceiro filho da prestigiosa família York, que representa a casa das Rosas Brancas. Desde seu nascimento, ele é considerado e tratado por sua mãe (Cécile) como uma criança amaldiçoada, a própria cria do diabo ou como uma punição dos céus por ser intersexo. Ele nasce em um momento conturbado para a família York, pois está em uma disputa pelo trono da Inglaterra contra a família Lancaster (casa das Rosas Vermelhas). As duas famílias ancestrais se odeiam e travam uma batalha pela coroa. Na história iremos acompanhar o Richard, a sua família e as pessoas ao seu redor no meio desse conflito. A narrativa é sobre a decadência de cada um desses personagens, incluindo o protagonista, que passará a ser o vilão enquanto cresce.
Tal qual “Yuukoku no Moriarty” em que eu não sabia nada da série de livros de “Sherlock Holmes”, também não conheço sobre as peças que estão sendo usadas de base por Aya Kanno para criar o mangá. Uma amiga (Gabi), até me mandou alguns PDFs e artigos sobre as peças, porém eu não li e pretendo não ler, pois assim como em “Moriarty”, quero ter o ar da surpresa, de ir descobrindo esses personagens, os rumos que eles vão ter e as suas personalidades. Quero ter o prazer de senti-los pela primeira vez e creio que isso me trará uma experiência melhor. Nesse sentido é importante frisar desde agora que os personagens não são feitos para serem bonzinhos. São famílias em uma guerra e essas exigem sacrifícios ou ações cruéis. Vão haver personagens que não vão hesitar em fazê-lo, enquanto outros serão induzidos e irão mudar por consequência de outras ações.
Esse volume cobre principalmente a infância e o começo da adolescência do Richard, sendo a partir dos próximos volumes que iremos acompanhar, aos poucos, a decadência dele e dos demais personagens. Nas primeiras páginas do mangá, temos uma mescla excelente entre a mãe do Richard falando para o Georges sobre uma bruxa que habita no fundo da floresta, como Jeanne (Joana) D’Arc que é dita como diabólica por ter se passado por um homem. Neste momento, vemos o Richard sozinho na floresta procurando por sua mãe e que ele começa a ouvir vozes dizendo que havia sido abandonado, que era uma criança maldita, fazendo uma alusão ao momento que nasceu, em que descrevem que uma tempestade forte estava caindo e que o parto foi muito sofrido. Essas vozes vão deixando ele amedrontado, como se estivesse preso. Em 10 páginas, Aya Kanno mostra a que veio. Ela sabe fazer transições, amarrar bem uma cena com a outra, intercalar com o passado, presente e nuances de futuro. Personagens que parecem desconexos, mas que conforme a leitura avança, se conectam com o que vimos naquelas 10 páginas iniciais.
O volume nos introduz ao Richard como uma criança negligenciada pela mãe e que nutre um amor muito grande pelo seu pai, sendo ele a sua “luz brilhante”. O volume tem muita simbologia com essa expressão, pois o Richard demonstra ter um medo enorme da escuridão. Nas primeiras páginas do volume 1, ele caminha sozinho numa floresta escura em que árvores parecem o atacar e em desespero, ele corre até a luz. Mesmo em buracos escuros e apertados, fica ofegante e apavorado, sempre correndo em desespero para sua luz. Essa luz, nesse volume, é representada majoritariamente por seu pai. No momento que ele escuta uma conversa que seu pai deseja ser Rei, ali é o momento de felicidade profunda, porque ali ele vê aquela oportunidade como um sinal de esperança.
No decorrer dos primeiros capítulos, Joanne D’Arc volta a aparecer como ela sendo um espírito que assombra o Richard, por sua imagem ser como ele, “um reflexo dela”, como a personagem diz. Ela não aparece tanto nesse volume, porém aparenta ser uma figura que será recorrente na narrativa, principalmente quando tiver conflitos de identidade do Richard, sobre o que ele é de fato, as limitações que pode ter e o que pode ou não experimentar, como sua vontade de ir para guerra e a desconfiança de que seu pai que não permite por conta do seu corpo, ou mesmo poder sentir amor e ser retribuído. Do lado materno, sua mãe tem um completo horror à sua pessoa. Fica completamente perturbada com a presença do Richard, enquanto que no amor romântico, temos uma ‘peça’ que vai ser importante para o Richard como uma forma de desilusão. Quando ele acha que enfim será amado, ele não recebe o que espera do outro lado e novamente o espírito da Jeanne volta a aparecer, dizendo que ele jamais será amado, reforçando que por ele ser como é, ninguém o entenderá, afinal, é uma história que se passa no século XV e sabemos bem como funciona a relação disso naquela época. Não é atoa que o Richard ser intersexo é segredo e poucas pessoas sabem disso. Apenas os familiares próximos sabem e correm apenas alguns rumores ao redor. E caso venha à público, quase certo que ele seria visto como bruxa, e sendo uma, seu destino é ser queimado vivo, tal qual Jeanne D’Arc. Por isso, que a figura dela na obra vai o acompanhar do começo ao fim, ou pelo menos durante um bom tempo como forma de atormentá-lo, de causar dúvida, sobretudo nessa fase que ainda tem um nível de inocência, de muitos questionamentos e um psicológico mais frágil por causa dessa exclusão de ter sido privado de amor.
Mas não é só da Casa das Rosas Brancas que Requiem é formado. Na outra ponta dessa história com os Lancaster, também vemos um pouco de seus personagens. O grande destaque de minha parte nesse 1º volume vai para a maravilhosa Margaret, que promete ser o próprio diabo na Terra. Ela ainda aparece pouco, porém já mostra potencial para os rumos da história. Ela é ambiciosa, deseja ser rainha a todo custo, e o melhor, ela quem toma as decisões da família Lancaster porque o marido (Henri VI) é um inútil. Me surpreende genuinamente ela poder liderar o exército, mas não só isso, como ir para a batalha também e de fato exercer o comando da casa. Me encanta isso na personagem, uma aura de poder, de perigo e até um pouco de sedução. Ela chama atenção e me faz querer saber mais do envolvimento dela com os vindouros rumos da obra.
O volume 1 apresenta muito bem esse universo e apresenta muito potencial para o que virá. É um mangá longo, sendo 17 volumes. Temos um bom caminho para percorrer, descobrir, se emocionar, empolgar e até mesmo, se impressionar. O volume 1 termina com uma virada excelente que deve mudar o Richard e sua forma de agir. Não entrarei em maiores detalhes, pois o sentido do texto é apenas apresentar o mangá sem dar spoilers. Comentários mais profundos ficam para o anime (que tentarei escrever semanalmente aqui no blog).
Quero dedicar esse momento final para falar um pouco da própria Aya Kanno. Eu não cheguei a ler “Otomen”. Quando começou a ser publicado aqui eu não colecionava mangás e não tive oportunidade de ter acesso as edições de outro país. Mas sei bem que Otomen é famoso pela comédia, por ser uma obra mais leve e que vai contra os papéis de gênero. Quando chegamos em “Le Requiem du Roi des Roses”, a comédia é bem pouco existente. O que mais pode se aproximar do humor aqui são quadros isolados com formatos chibis dos personagens e bem pontuais mesmo. Isso mostra a versatilidade da autora, dado que ela saiu de Otomen e foi para Requiem, uma mudança temática absurda e que não são todos os autores que conseguem lidar tão bem. Gosto muito desse aspecto da autora. Sua arte evoluiu muito. É visível só de olhar para as capas do mangá. A leitura é dinâmica e boa. Um pouco mais carregada por conta dos diálogos, mas que te prende à narrativa.
“Le Requiem du Roi des Roses” é um mangá mais longo que os demais que já comentamos na nossa série de postagens, porém é uma leitura que vale muito a pena e vai na contramão das falas de que shoujo é puramente romance escolar, mahou shoujo e afins. Também queria aproveitar que o anime irá estrear para fazer essa apresentação e instigar a procura/pedidos para as editoras, ainda mais que acho que o anime não será tão bom quanto o mangá. Fica a nossa recomendação forte para a obra ^^
Nesse caso aqui, acho que “Baraou no Souretsu” é um título mais para a Panini. Mangá longo e querendo ou não, eles já trabalharam com um mangá da autora (por mais que tenha sido cancelado). Em todo caso, aqui você pode deixar a sua sugestão para a NewPOP no Cantinho de Sugestões (que também está fixado no Twitter oficial deles). Para a JBC, peça no Indique JBC. E para pedir para a Panini ou Devir, mande uma mensagem por DM no Instagram das editoras ^^
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